Quando a gente pensa em TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), geralmente vem à mente aquela dificuldade de foco ou a tendência à impulsividade em várias áreas da vida. Mas é menos comum relacionar o TDAH à nossa relação com a comida. Ainda assim, quem convive com esse diagnóstico sabe o quanto a alimentação pode virar um ponto crítico, sobretudo quando o cérebro busca recompensas imediatas para lidar com tensões do cotidiano. O comer emocional não é uma exclusividade de quem tem TDAH, mas esse transtorno pode bagunçar ainda mais o impulso de ir atrás de um doce ou salgado como válvula de escape.
O TDAH é caracterizado por sintomas de desatenção, impulsividade e, em muitos casos, hiperatividade. É uma condição neurobiológica em que o cérebro, na ânsia de buscar estímulos rápidos, acaba interferindo em escolhas e comportamentos. Isso vale para várias atividades do dia a dia: trabalho, estudos e até mesmo para a forma como a pessoa se relaciona com a comida. Não é simplesmente “falta de força de vontade”, mas sim um cérebro que pode sentir uma urgência maior por recompensas instantâneas, como aquela guloseima que promete alguns segundos de alívio ou prazer.

Quando falamos em comer emocional, nos referimos ao ato de usar a comida para regular emoções incômodas ou amenizar momentos de stress, tristeza ou até tédio. Para quem tem TDAH, as oscilações de foco, o excesso de estímulos internos e externos, e a dificuldade em planejar as refeições podem criar um cenário mais propenso ao comer emocional. Nem sempre há tempo ou paciência para organizar um cardápio; os lanches rápidos e altamente calóricos acabam sendo a opção mais acessível no meio do turbilhão de tarefas. Se isso se torna frequente, há o risco de descontrole, culpa e a perpetuação de um ciclo onde as emoções complicadas geram mais impulso alimentar.
Em termos cerebrais, a busca por recompensas imediatas está ligada a áreas como o córtex pré-frontal, envolvido na tomada de decisões e controle inibitório, e ao sistema de dopamina, que sinaliza prazer e motivação. No TDAH, esse sistema pode funcionar de um jeito que favorece a impulsividade, e a comida hipercalórica é um alvo fácil para esse padrão. O alívio rápido que a comida oferece acaba reforçando a repetição do comportamento. Além disso, a distração e a desorganização podem levar a pulos de refeição ou a compras de mantimentos pouco saudáveis, gerando um cenário em que a alimentação é guiada mais pelas urgências do momento do que por um plano equilibrado.
Por outro lado, não significa que todo mundo com TDAH vai ter problemas constantes de comer emocional. Cada organismo é único. Mas, se você sente que frequentemente usa a comida como escape, vale notar se existe um componente de impulsividade típico do TDAH. Essa percepção inicial é valiosa, pois ao entender o mecanismo, fica menos provável encarar tudo como pura falta de disciplina. Assim, podemos abrir espaço para estratégias mais adequadas: seja apoio psicológico e nutricional, seja acompanhamento psiquiátrico para ajustes de medicação, seja a busca por ferramentas de organização alimentar.
Entre as ferramentas, há quem se beneficie de lembretes no celular para horário das refeições, de um pequeno diário alimentar para identificar gatilhos emocionais ou de praticar pausas antes de comer, tentando notar se a fome é física ou emocional. Também existem abordagens terapêuticas específicas que ajudam a lidar com a ansiedade e a impulsividade, permitindo frear esse automatismo de “sentir algo ruim → comer imediatamente para melhorar”. É um processo de autoconhecimento que pode reduzir os momentos de descontrole.
Em resumo, o TDAH pode influenciar bastante o modo como nos relacionamos com a comida. O comer emocional, motivado pela necessidade de aliviar alguma tensão interna, encontra no cérebro com TDAH um terreno fértil para acontecer de modo ainda mais automático. Nesse contexto, informação e conscientização fazem toda a diferença. Perceber esse padrão é o primeiro passo para buscar ajuda especializada ou até para criar algumas estratégias de manejo diário. Afinal, lidar de forma mais tranquila com a alimentação não precisa ser algo inatingível, mesmo com todos os desafios que o TDAH traz.
Para quem se identificou, vale a pena ficar de olho em conteúdo confiável e, se possível, discutir o assunto com profissionais de saúde. Afinal, entender como o cérebro funciona é a base para mudanças consistentes. Busque sempre fontes especializadas e lembre que não existe “solução mágica”: o que realmente ajuda é um olhar individualizado e, em muitos casos, a soma de psicoterapia, nutrição e acompanhamento médico. Nada de se culpar por deslizes: conhecimento, planejamento e acolhimento costumam trazer avanços bem significativos.
Referências para Leitura:
Faraone SV et al. (2019). The World Federation of ADHD International Consensus Statement: 208 Evidence-based conclusions about the disorder. Neuroscience & Biobehavioral Reviews, 100, 223–250.
Braden AL et al. (2018). Emotional eating and weight regulation: a review. Current Diabetes Reports, 18(8), 59.
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